quinta-feira, 28 de novembro de 2013

ESTADO TERMINAL




DIÁRIO DE UMA ESPERA!

Paciente: Joana D´Arc  Entrada no hospital: 21/06/93    horas: 14:00

Saída do hospital: 30/06/93      horas: 16:30


Diagnóstico:  "O MALDITO CÂNCER"
  
Apenas 10 dias de vida.... essas palavras martelavam a minha cabeça o tempo todo.
  
Foi isso que me disse o médico , quando fui buscar Joana D´arc no hospital.


Apenas dez dias de vida...Aquelas palavras soaram como uma punhalada, perdi a noção de tempo e espaço, não queria acreditar e comecei a cantar um mantra desesperadamente, então ouvi o médico dizer friamente :

 Não adianta rezar, suas orações não vão adiantar de nada, nem levando Joana para os EUA. 
Pedi um copo d´água e fui para casa com minha querida mãezinha.
  
Ali no quarto, sentada na poltrona, vigiava a pouca vida que ainda lhe restava.
Então comecei a escrever "O Diário de uma Espera".

Primeiro dia: 30/06/1993

 Tanto na dor quanto na morte estamos sós.
A solidão é a agonia de quem sofre.
Meu Deus, como dói perder o ser amado.
Mulher...gera a vida e morre por esta mesma vida que gerou.
Somos nada diante da morte.
Chorões e indefesos é o que somos, perante a morte.
A morte é inevitável para quem vive. O difícil é aceitá-la!
Dizem que apenas o corpo morre que a alma é imortal, será mesmo...?
Este mistério só será desvendado quando morrermos.
Joana dárc esta indo embora e não posso fazer nada para detê-la, mais dia, menos dia, é fatal.
Será que existem milagres?
Será que a hora chegou?
Será que a dor é uma purificação?
E a reencarnação existe?
São tantas duvidas..............
Parece que o sofrimento é o sentimento mais profundo que temos,
a dor é individual, ninguém sofre ou morre por nós.
O apego nos faz sofrer como cães danado.
Joana, você me deu a vida e se pudesse lhe daria a minha vida!
Oh! Deus tenha misericórdia de minha mãe, não a deixe
sofrer, cure a sua doença ou leve-a para junto de vós.
 Pai nosso que estais no céu, santificado..... Amém!

 Terceiro dia:03/07/1993

Sentada, esperando, esperando....
Esperando a morte do corpo chegar.
A morte do corpo do ser amado.
Sentada no sofá em frente a cama do moribundo... Ali sentada, horas a fio, olhando, observando, esperando......
Observando os olhos da morte, olhos de horror, olhos de sofrimento e dor.
E Deus, onde está?
Deus existe?
Aonde e quando?
Em nenhum lugar, só a dor existe.
Quanta maldade! o ser amado sofre tamanha dor que desfigura até a alma e tenho que assistir toda esta dor até o fim.
Fim que nunca chega, dor que nunca acaba e eu aqui de espectador sem poder fazer nada, absolutamente nada.

Se for purificação para chegar a Deus, então o ser amado já está no céu, e eu aqui mutilada, seca, dura, amarga, triste e revoltada.
Krishna, Cristo, Deus se realmente existes, tenha misericórdia do ser amado, cure-o, alivie a sua dor ou leve-o de uma vez.

É maldade demais deixa-lo sofrer dessa maneira....


Quarto dia:04/07/1993

Todos vem ver o moribundo, um por um adentra o quarto, é aquele entra e sai o dia inteiro.

Um comenta:  - coitada, não consegue descansar.
Outro diz: - oh! mas você está muito bem,
E outro: - o pior já passou, e no fundo pensa, coitado está morrendo.
  
Depois entram aqueles irmão da igreja querendo curar, mandando o moribundo levantar, achando que vão realizar um milagre, coitada! se ela pudesse falar...

O moribundo geme, chora e ainda é obrigado a rir um riso de dor.

 E as horas passam lentamente....

 A maldita comendo por dentro, borbulhando, matando a cada minuto.

O ser amado na esperança de viver, planeja o futuro.
  
Enterrado na cama, vivo dentro de um caixão... e a lua lá fora cheia, amarela enorme e bendita..... lua linda, forte, traz a vida e a morte.
  
Lua linda, lua bendita, quanto tempo mais?
  
Quanto tempo, um dia, um mês, um ano, um século?

 Só Deus sabe, só Deus.....
e então só me resta a oração......
Pai nosso que estais no céu, santificado..... Amém!

Quinto dia:05/07/1993

A cada dia, a cada passo, a cada segundo, a cada dor, a cada suspiro, a cada gemido, a cada hora...... Angustia, sofrimento, dor, solidão, vazio e lágrimas.

 Aprisionamento da alma, aprisionamento da alma no corpo, Aprisionamento da alma, do corpo e da mente.


Mundo cheio de misérias, vida cheia de alegria e dor. 
A dor corrói, fere e mutila a alma da gente....

Oitavo dia: 08/07/1993

       Liberdade de um prisioneiro,

 Liberdade de uma prisão,

Liberdade de uma alma,
  
          Liberdade do corpo da prisão,
  
        Liberdade da alma do corpo,

           Liberdade do mundo material.

 Prisão verdadeira é a prisão material, a alma liberta, voa...voa.

 Voa alto como um pássaro.


Liberdade, doce liberdade, liberdade da alma, sofrimento do corpo, liberdade e prisão, alegria e tristeza.
  
Mais uma vez eu pergunto: existe Deus?
  
Existe! Acredite se puder.
  
Obrigada meu Deus pela libertação, obrigada pela dor, Obrigada pela doença, maldita doença que aniquila e faz sofrer, obrigada meu Deus por essa purificação d'alma.
  
Perdão meu Deus, se não o compreendo, perdão pela revolta, Perdão pela falta de fé, perdão pelo desrespeito.

Por favor meu Deus, seja misericordioso, não a deixe sofrer, Cure-a ou a leve contigo.

Pai nosso que estais no céu, santificado..... Amém!

Ultimo Dia:21/07/1993

No dia 21 de julho  de 1993 Joana D'arc minha mãezinha querida, foi embora e deixou de sofrer.


O dia 21 de julho  amanheceu diferente, eu me sentia triste, muito triste.
  
Acordei e fui direto ver Joana, minha mãezinha, ela estava muito ruim naquela manhã, não falava mais, não abria mais os olhos

Então senti que deveria ir até a funerária.
  
Foi com o peito estourando de dor, que cheguei junto a ela e disse bem baixinho ao seu ouvido: Mãezinha não lute mais, pare de sofrer, vá em paz, não se preocupe com nada, vou dar uma saída mas volto logo.

Ela abriu os olhos, como a pedir que eu não saísse.
  
Fui até a funerária e resolvi o que tinha para resolver e voltei para casa.
  
Não fui logo ver minha mãe, fui primeiro tomar um café, para tomar coragem de ir vê-la novamente.


Nem tomei o café direito pois ouvi um chamado de minha mãe, ela chamava i...i...i..., não conseguia mais me chamar pelo  nome Iris.
  
Corri até ela, apertei sua mão.... era a despedida, ela me chamou para se despedir, era o fim do sofrimento, ela me ouviu, ela resolveu deixar este mundo, deixar de sofrer.
Não consegui ver a sua vida se extinguir até o final, não pude suportar e desesperadamente larguei sua mão, chamei meu irmão para ficar com ela e longe dali, longe daquele quarto onde passei horas de sofrimento, cai de joelhos e chorei um pranto desesperado de dor e saudades....

Depois vocês já sabem, funeral e muita tristeza.
  
Quando voltei para casa fui direto para o quarto onde Joana passou seus últimos dias,
  
Senti ali um forte cheiro, um cheiro quente, um cheiro que jamais havia sentido.  
Aquele cheiro era com certeza o cheiro da morte.

Nunca esquecerei aquele cheiro e espero nunca mais senti-lo.
  
Saímos do Rio de Janeiro com destino a Jaboticabal, interior de São Paulo no dia 20 de junho, com a finalidade de tirar meu irmão  da cadeia.

Conseguimos!!

 Parece que houve uma troca.
  
A vida da mãe pela liberdade do filho.
  

Ou será o contrário?




Posto aqui o relato de minha prima Madá, que sofreu junto comigo. 


É Iris.... Sei tudo q passou durante esses 10 dias, pois ali eu estava nos últimos momentos d tia Joana.
Nunca vou me esquecer daquelas ultimas hs d angustia.
Demos o banho, colocamos um vestido novo q vc havia comprado, lindo! Cheio d florzinhas, para enfeitar uma flor.
Algumas horinhas depois começou a angustia da morte.
De fora do quarto dela havia um aparelhinho d som q tocava musicas da sua religião(budismo),enquanto isso ela piorava.
 Tulio começa a ler o salmo 23, não consegue continuar,Lucia pega a bíblia tremula e continua , tia se agarrou a mim,com muita força, Enfim Lucia termina o salmo, e tia dá um suspiro, e um jato d vômito sai d sua boca, ela me aperta, ficando suas unhas em meu peito e foi escorregando , escorregando , e....se....foi...
Então a deitamos, e veio o FIM..............

Nunca vou me esquecer desses momentos tristes e dolorosos.... Desculpe Iris, fiquei c vontade d relatar esse fato. Bjs,